Que o Japão é um país extremamente machista, quem já foi sabe. No teatro kabuki, apenas homens interpretam personagens masculinos e femininos. Nos negócios, praticamente não existem mulheres no topo da hierarquia corporativa (e mais da metade das poucas presidentes de empresa no Japão herdaram o cargo de algum parente). Na política, você tampouco irá encontrá-las. E na gastronomia é a mesma coisa: você nunca verá uma mulher atrás de um balcão de sushi (ou mesmo trabalhando nas cozinhas dos mais famosos restaurantes do Japão), porque acredita-se que as mãos femininas são mais quentes e menores que a dos homens, o que as tornam inapropriadas para fazer sushi ou sashimi, que as mulheres são frágeis para o trabalho duro da cozinha, ou ainda, segundo Jiro Ono, do Sukiyabashi Jiro, em Tóquio, “porque o ciclo menstrual afeta o paladar das mulheres” (e todas as mudanças neste panorama ainda são bem tímidas). Mas, em São Paulo, a chef Telma Shiraishi conquistou não só o respeito da comunidade japonesa paulistana mas também dos nihonjin, os (exigentes) japoneses expatriados (incluindo o cônsul-geral do Japão em São Paulo e vários executivos de grandes empresas japonesas em cujas casas ela é convidada para preparar jantares), e comanda hoje um dos melhores restaurantes japoneses da cidade, o Aizomê (“aizome” [ 藍染 ] é o nome em japonês da técnica milenar de tingimento de tecidos com o índigo ou anil), que completa em 2017 dez anos.
Telma, terceira geração de uma família de imigrantes japoneses, não fica no balcão frio, no entanto. O seu lugar é na cozinha, de onde saem equilibradas receitas quentes e frias — o forte do Aizomê, preciso dizer — que formam o ótimo menu-degustação, o omakase. Nos pratos lindamente apresentados (não deixe de ver as fotos abaixo), montados em porcelanas criadas especialmente para o restaurante numa parceria entre Telma e a ceramista Kimi Nii, você encontrará, apesar da liberdade criativa, valores autenticamente japoneses: ingredientes sazonais e locais, alguns plantados na própria horta do restaurante ou por pequenos agricultores, também japoneses, parceiros de Telma, como Marisa Ono (não existe salmão no Aizomê: “tendo o Brasil uma costa enorme com tantas espécies de peixes, por que comprar um peixe importado, criado em cativeiro?”, me diz ela, “e robalo, por conta da sobrepesca, a gente só compra quando sabe que ele foi pescado artesanalmente” ); a cultura do mottainai (os japoneses execram o desperdício, portanto, no Aizomê aproveita-se ao máximo o alimento, sejam os talos para o preparo de conservas feitas na própria casa ou as partes do peixe para a confecção de caldos); e o omotenashi, que é a cultura da hospitalidade japonesa que fascina o mundo.
Mas o talento feminino por trás do Aizomê não acaba aí. Além da apresentação e do ambiente discreto (instalado numa casa sem nome na porta e de porta fechada, que abriga um lindo balcão com cadeiras altas e uma linda cartela de madeiras em toda a decoração, não é um restaurante para ver e ser visto), duas outras grandes mulheres brilham na carta de sobremesas (aliás, um dos poucos japoneses que investem em doces): a chef patissière Vivianne Wakuda, especialista em yogashi {confira nossa matéria exclusiva sobre o trabalho da Vivianne, clicando aqui} e a Marcia Garbin, maestra gelatiere da Gelato Boutique, que prepara os sorvetes incríveis com ingredientes japoneses que acompanham algumas sobremesas da casa (ou podem ser comidos puros) {confira nossa matéria sobre a Gelato Boutique, clicando aqui}.
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O salão privativo que fica no térreo, anexo ao balcão, onde cabem até seis pessoas. Lindas madeiras. Imagem: Divulgação | Rafael Salvador
Adoro o balcão com cadeiras altas do Aizomê; o coração do restaurante onde cabem 13 comensais. Imagem: Shoichi Iwashita
Depois de um tamagodoofu perfeito com ikura e quiabo, marisco branco grelhado, com toque de manteiga, alho e shiso, com lula, três tipo de cogumelos e nira. Delicioso. Imagem: Shoichi Iwashita
Siri mole frito com mini linguado. Apresentação surpreendente. Imagem: Shoichi Iwashita
Hora do sashimi (e nada de salmão aqui): toro de atum, toro de buri (olho-de-boi), carapau e linguado com saladinha delicada. Imagem: Shoichi Iwashita
Peixe do dia grelhado, legumes salteados, com molho de miso e maracujá e sementinhas de papoula, um dos clássicos do restaurante. Imagem: Shoichi Iwashita
Peixe do dia (aqui, namorado) grelhado e coberto com berinjela ao miso e chips (batata doce, abóbora, raiz de lótus). Delicioso jogo de texturas. Imagem: Shoichi Iwashita
Prato frio: um chasoba (um macarrão de trigo sarraceno feito com chá verde) com onsen tamago (ovo perfeito) e ikura, nori, quiabo, gergelim e algas. Atenção para o dashi, que deve ser bebido porque é delicioso. Imagem: Shoichi Iwashita
Um dos pontos altos do jantar: o magret (o peito do pato gordo criado para a produção de foie gras), com molho de kinkan, vinho do porto, shooyu e mirin. Perfeito. Imagem: Shoichi Iwashita
Nas sobremesas, o clássico da casa: soufflé de chocolate, sorvete de creme da Gelato Boutique e calda de wasabi. Imagem: Shoichi Iwashita
O surpreendente gelato de miso caramelizado. A versão japonesa do caramel au beurre salé. Imagem: Shoichi Iwashita
Das criações da chef pâtissière Vivianne Wakuda, a luna de matcha (mousse do pó do chá verde com azuki ) e frutas frescas. Imagem: Shoichi Iwashita
Na escada que leva ao primeiro andar, uma instalação de origami com tsuru feitos de papel dourado. Imagem: Shoichi Iwashita
O salão privado onde cabem até seis pessoas no térreo anexo ao balcão do Aizomê. Imagem: Divulgação | Rafael Salvador
Alameda Fernão Cardim 39
quase esquina com a Brigadeiro Luís Antônio
Jardins
Metrô Brigadeiro
(Linha Verde)
55 11 / 3251-5157
As reservas podem ser feitas pelo telefone acima
Preço por pessoa: R$ 210 o menu-degustação + serviço 10% R$ 21,00 + estacionamento R$ 20 = US$ 532.
Aceita todos os cartões de crédito.
Segunda a sexta:
Almoço, das 12h às 14h30
Jantar, das 18h30 às 23h
Sábado:
Só jantar, das 18h30 às 23h
Domingo:
Fecha
Fecha também nos feriados
50 lugares, sendo 13 lugares no balcão
Tem manobrista
A casa tem um estacionamento
Chef Telma Shiraishi
Desde 2007
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